8 de outubro de 2009

Amália



Lágrima - Amália Rodrigues

Cheia de penas me deito
E com mais penas me levanto
Já me ficou no meu peito
O jeito de te querer tanto

Tenho por meu desespero
Dentro de mim o castigo
Eu digo que não te quero
E de noite sonho contigo

Se considero que um dia hei-de morrer
No desespero que tenho de te não ver
Estendo o meu xaile no chão
E deixo-me adormecer

Se eu soubesse que morrendo
Tu me havias de chorar
Por uma lágrima tua
Que alegria me deixaria matar


Sendo eu uma amante de fado, não poderia deixar passar a oportunidade de fazer uma insignificante homenagem à minha fadista preferida.
Alerto para o facto de a Amália ser a minha fadista preferida porque, além de cantar com a alma até mais do que com o coração, era uma mulher inteligente, sagaz, lutadora, audaz, que não se deixava dormir à sombra das centenas de louros já conquistados mas procurava sempre mais e melhor, com uma sede de conhecimento e sentimentos que pareciam jamais satisfeitos; e não por ser a única fadista que conheço, como acontece a algumas centenas de “fãs” de fado.
Parece-me também que procurou o amor durante toda a vida. Poderá ter encontrado paixões mas parece que nunca encontrou o Amor. Ou o Amor nunca a encontrou. Mas isso já são fantasias do meu imaginário.
Este fado que aqui coloco, não será o meu favorito da Amália mas ilustra muitas coisas com as quais me identifico de momento. Muitas, mas não todas.
Na 1ª estrofe, a nossa primeira sensação será que a Amália estaria numa capoeira (penas e mais penas). Com essa parte não me identifico. Nem com a hipótese da capoeira, nem com a hipótese de auto comiseração. Julgo que poderá ser o pior sentimento a termos de nós próprios. Reduz-nos logo a seres fracos, medíocres, e dos fracos não reza a história. Quanto ao “jeito” de lhe querer tanto, os “endireitas” servem para quê?
Na 2ª estrofe, identifico-me com o desespero, com um grande castigo, mas ainda não cheguei à parte de dizer que não quero e não sonho com a pessoa amada porque não tenho dormido o suficiente para isso.
Na 3ª estrofe, estou quase a 100% com a Amália menos a parte do xaile. No meu caso seria mais uma mantinha e adormecer no sofá depois de esgotada de líquidos e já sem saco lacrimal.
Na 4ª e última estrofe, ainda não estou nesse nível. Espero nunca chegar a esse nível de desespero. Se eu amo a pessoa e quero estar com ela, de que me serve a lágrima dela depois de eu estar morta? Mais uma achega à piedade, desta vez à piedade de outrem.
Lágrimas da pessoa amada… Só de alegria!

1 comentário:

  1. Tu devias era estar ali ao lado dos "gatos fedorentos", a ganhar uma pipa de massa. Se em plena crise ainda consegues fazer humor...
    Gostei desta tua variação sobre o fado da Amália.

    cigarra

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